A indústria de fundição é um dos pilares da economia brasileira, fundamental para cadeias produtivas que vão do setor automotivo à construção civil. No entanto, por trás de sua força produtiva, existe um fato inegável: segundo dados de observatórios de SST, a indústria de transformação, onde a metalurgia se insere, concentra um número alarmante de acidentes de trabalho. Isso posiciona a fundição como um dos ambientes de maior complexidade e risco para a saúde e segurança do trabalho.

Gerenciar a SST em uma fundição vai muito além de apenas distribuir EPIs, envolvendo uma compreensão profunda dos riscos físicos, químicos e de acidentes que permeiam cada etapa do processo. Para uma gestão eficaz, é preciso dominar a legislação, saber como avaliar os agentes nocivos e, acima de tudo, construir uma cultura de prevenção que realmente funcione na prática.

Pode ficar tranquilo. Este guia é o mapa completo que você, profissional de SST (e Revendas também!), precisa. Ele foi pensado como um recurso definitivo para consultar a qualquer momento, desde o mapeamento detalhado de perigos até a gestão de conformidade com as normas, garantindo a proteção integral da sua equipe.

Vamos lá?

Mapeando os riscos em cada etapa da fundição

Para uma gestão de segurança eficaz, não basta listar os perigos de forma genérica, é crucial conectar cada risco à sua origem no processo produtivo. Vamos detalhar os perigos invisíveis e os mais evidentes em cada fase, ok?

Fase de preparação e fusão

  • Calor radiante e de contato: aqui, os operadores de forno lidam com um inimigo invisível, mas potente. O calor radiante é emitido pelos fornos e pelo metal derretido, podendo causar estresse térmico severo, que leva a uma perigosa desidratação com a rápida perda de eletrólitos essenciais para o corpo, além do risco de queimaduras graves. O calor de contato, por sua vez, representa o risco de queimaduras ao manusear equipamentos e ferramentas aquecidas.
  • Fumos metálicos e gases tóxicos: durante a fusão, os metais liberam vapores que, ao se resfriarem, formam partículas finíssimas conhecidas como fumos metálicos. A inalação de fumos de chumbo, manganês, zinco ou cádmio pode causar doenças pulmonares e neurológicas graves. Além disso, a queima incompleta pode gerar monóxido de carbono (CO), um gás asfixiante, inodoro e letal.
  • Ruído: os fornos, sistemas de exaustão e a movimentação de materiais geram um nível de ruído que frequentemente ultrapassa os limites de tolerância. A exposição contínua sem a proteção adequada leva à Perda Auditiva Induzida por Ruído (PAIR), uma condição permanente e incapacitante.

Fase de vazamento e moldagem

  • Respingos de metal fundido: este é, talvez, o risco mais icônico e perigoso da fundição. A projeção de metal líquido, que pode chegar a mais de 1600°C, causa queimaduras de terceiro grau instantaneamente, sendo uma das principais causas de acidentes graves e fatais no setor.
  • Incêndio e explosões: o manuseio de metal líquido sempre carrega o risco de incêndio. Um vazamento descontrolado que entra em contato com materiais inflamáveis ou mesmo com umidade (a água se decompõe violentamente em contato com o metal fundido) pode gerar explosões de grandes proporções.

Fase de desmoldagem e acabamento

  • Poeiras (sílica): na etapa de quebra dos moldes de areia (desmoldagem) e no processo de acabamento (rebarbação, lixamento), uma grande quantidade de poeira é gerada. Muitas dessas poeiras contêm sílica cristalina, um agente que, quando inalado, causa silicose, uma doença pulmonar crônica, progressiva e incurável.
  • Vibração: o uso de ferramentas manuais vibratórias, como esmerilhadeiras e marteletes para rebarbar as peças, expõe os trabalhadores a riscos de vibração em mãos e braços (VMB). Essa exposição pode levar a distúrbios vasculares, neurológicos e musculoesqueléticos.
  • Riscos de acidentes (mecânicos): a movimentação de peças pesadas, o uso de prensas e o manuseio de componentes brutos ou semi-acabados criam um cenário constante para riscos de impacto, esmagamento de membros e cortes profundos.

Seleção de EPIs por risco: proteção da cabeça aos pés

A escolha do EPI correto é uma ciência. Ela deve ser uma resposta direta a um risco mapeado e, para te ajudar nisso, preparamos uma análise técnica aprofundada sobre os EPIs para fundição, detalhando as normas e tecnologias de proteção. De forma resumida, apresentar o equipamento certo para o perigo certo é a forma mais eficaz de garantir a segurança.

Para calor e respingos de metal fundido

Para fumos, gases e poeiras

  • Proteção respiratória: a proteção contra os agentes químicos invisíveis é vital. É indispensável o uso de respiradores com filtros específicos para cada contaminante. Contra fumos metálicos e poeiras de sílica, os filtros da classe PFF2 (P2) ou PFF3 (P3) são os mais indicados, dependendo da concentração do agente no ar.

Para riscos de impacto e ruído

  • Protetores faciais e óculos de segurança: o protetor facial, especialmente os modelos com visor amplo, é crucial para proteger o rosto contra partículas volantes e respingos. Ele deve ser usado em conjunto com óculos de segurança para uma proteção ocular completa.
  • Capacetes de segurança: indispensáveis em toda a planta para proteger contra a queda de objetos e impactos na cabeça.
  • Protetores auditivos: tanto os modelos tipo concha (abafadores) quanto os de inserção (plugs) são eficazes, e a escolha deve se basar no nível de ruído e na preferência do trabalhador para garantir o uso contínuo.

Legislação e Gestão: o pilar da conformidade em fundição

As Normas Regulamentadoras (NRs) formam a base legal da segurança do trabalho no Brasil. No contexto da fundição, várias delas se aplicam e “conversam entre si”. Entender essa relação é fundamental para uma operação segura e em conformidade.

NR 4 e NR 1 (PGR): a estrutura da gestão de SST

A base da gestão começa com o SESMT (Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho), previsto na NR 4, que é a equipe responsável por planejar e executar as ações de segurança. Essa equipe utiliza o PGR (Programa de Gerenciamento de Riscos) da NR 1 como ferramenta central para identificar, avaliar e controlar todos os riscos presentes na fundição.

NR 6 e o Certificado de Aprovação (C.A.): a garantia do EPI

Tudo começa aqui. A NR 6 estabelece que todo e qualquer EPI, nacional ou importado, só pode ser comercializado e utilizado com a indicação do Certificado de Aprovação (C.A.), expedido pelo Ministério do Trabalho. Um EPI sem CA é um equipamento ilegal e que não oferece garantia de proteção.

NR 15 e NR 9: a nova dinâmica da insalubridade

Respondendo a uma pergunta crucial: “quem trabalha em fundição tem direito a adicional de insalubridade?”. A resposta está na interação entre as normas, que foram atualizadas. A NR 15, continua estabelecendo os limites de tolerância para a maioria dos agentes, como ruído e químicos.

Contudo, a avaliação da exposição ao calor passou por uma mudança importante: o antigo Anexo 3 da NR 15 foi transferido para a NR 9, tornando-se seu Anexo III. A NR 9 agora foca na metodologia de avaliação e controle desses agentes, fornecendo as ferramentas técnicas que subsidiam as informações do PGR.

Resumindo: a NR 15 diz “o quanto” é insalubre, e a NR 9 (com seu anexo de calor) diz “como medir” para provar, com toda a gestão de riscos centralizada no PGR.

NR 14 e NR 12: segurança em fornos e máquinas

Duas normas são críticas para os equipamentos da fundição. A NR 14 estabelece todos os requisitos de segurança para a construção e operação de fornos. Já a NR 12 trata da proteção em máquinas e equipamentos, sendo vital para prensas, esteiras e lixadeiras, prevenindo prensamentos, amputações e outros acidentes graves.

Outras NRs aplicáveis: um panorama completo

Além das normas já citadas, outras podem ser aplicáveis dependendo do contexto da operação, como a NR 17 (ergonomia), que trata da adaptação das condições de trabalho para o bem-estar do colaborador, e a NR23 (proteção contra incêndios), essencial em um ambiente com tantos riscos térmicos.

A cultura de segurança: o pilar que une técnica e comportamento

De nada adianta ter os melhores equipamentos e processos se a cultura da empresa não prioriza a segurança em cada decisão. Este é o pilar que sustenta todos os outros.

Treinamento e capacitação contínua: o alicerce da prevenção

A prevenção eficaz depende de uma equipe bem informada. Isso significa ir além do treinamento inicial, promovendo reciclagens periódicas, diálogos diários de segurança (DDS) e campanhas de conscientização que reforcem constantemente a percepção de risco e os procedimentos corretos para cada tarefa.

Engajamento da liderança: o exemplo que inspira

A cultura de segurança é construída de cima para baixo. Quando líderes, supervisores e gestores participam ativamente das inspeções, usam os EPIs corretamente e demonstram um compromisso visível com a segurança, eles inspiram o mesmo comportamento em toda a equipe, criando um ambiente onde todos se sentem responsáveis pela proteção de todos.

Perguntas frequentes sobre segurança em fundição (FAQ)

Para complementar as informações do nosso guia, antecipamos algumas das questões mais comuns que desafiam os profissionais no chão de fábrica. Abaixo, você encontra um resumo prático com respostas objetivas para dúvidas essenciais sobre normas, riscos e direitos, funcionando como uma referência de consulta rápida.

Qual a NR que fala sobre fundição?

Não há uma única NR para fundição, mas um conjunto delas. As principais são a NR 14 (Fornos), NR 15 (Insalubridade por calor, ruído e químicos), NR 12 (Máquinas), NR 6 (EPIs) e a NR 1, com seu Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).

Quem trabalha em fundição tem direito a insalubridade?

Sim, na maioria dos casos. O direito é determinado por um laudo técnico que mede a exposição a agentes como calor, ruído e fumos metálicos, conforme os limites de tolerância estabelecidos pela NR 15. Se os limites forem ultrapassados, o adicional é devido.

Quais os principais riscos no processo de fundição?

Os principais riscos incluem queimaduras por calor radiante e respingos de metal líquido, doenças respiratórias pela inalação de fumos metálicos e sílica, perda auditiva por ruído excessivo, e acidentes mecânicos como esmagamentos e cortes.

Quais os EPIs obrigatórios para o processo de fundição de metais?

A lista de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) essenciais para a fundição é extensa e varia com a função, mas os itens obrigatórios geralmente incluem:

  • Proteção contra calor e metal fundido: conjuntos de vestimentas aluminizadas (calça, blusão, capuz), luvas para alta temperatura e mangotes de segurança.
  • Proteção da cabeça e face: capacete de segurança e protetores faciais resistentes a impacto e calor.
  • Proteção respiratória: respiradores com filtros específicos para fumos metálicos e poeiras de sílica.
  • Proteção auditiva: protetores auriculares (tipo plug ou concha) para atenuação do ruído.
  • Proteção para os pés: botas de segurança com biqueira de aço e proteção contra agentes térmicos.

É fundamental lembrar que a seleção exata e a especificação de cada EPI devem ser baseadas no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) da empresa e na atividade específica de cada trabalhador.

O que diz a NR 14 sobre fornos?

A NR 14 estabelece os requisitos de segurança para a construção e operação de fornos, exigindo que sejam construídos com materiais resistentes, possuam sistemas de segurança para evitar explosões e vazamentos, e que a área ao redor tenha piso adequado para prevenir quedas e acidentes.

Conclusão: segurança em fundição é um ecossistema

Se chegamos até aqui, uma ideia ficou clara: a segurança eficaz em uma fundição é um ecossistema. É o resultado da união perfeita entre uma análise de riscos profunda e conectada ao processo, da escolha técnica e correta dos EPIs para cada perigo e de uma gestão rigorosa e inteligente da legislação aplicável.

Ignorar um desses 3 pilares é deixar uma porta aberta para acidentes, passivos trabalhistas e, o mais grave, para falhas na proteção da vida dos trabalhadores.

Acreditamos que o conhecimento compartilhado é a ferramenta mais poderosa para a prevenção. Por isso, este guia é um ponto de partida, e queremos ouvir você. Faltou algum ponto importante na sua opinião? Você tem alguma dúvida ou uma experiência do seu dia a dia para compartilhar? Deixe seu comentário abaixo. Ao discutir abertamente sobre os desafios, toda a indústria de fundição se torna mais segura e forte.

E se sua empresa precisa de um parceiro que entenda a fundo esses desafios, conte conosco. A SUPREMA oferece mais do que EPIs; oferecemos consultoria para garantir a segurança e a conformidade da sua operação. Fale com um de nossos especialistas.

Um grande abraço e até o próximo conteúdo.